03/09/2017

Historiador de Engenheiro Coelho conta trajetória de emancipação do município

Edison Fávero é arquiteto e sempre lutou pela emancipação do município

Michael Harteman

Conversar com Edison Fávero é ter a oportunidade de estar frente a frente com a história. Poderia se dizer que ele nasceu em Engenheiro Coelho, mas talvez, o mais correto, seria afirmar que o nascimento da cidade tem tudo a ver com esse simpático senhor.

Seja como for, o escritor nasceu no solo vermelho coelhense, em maio de 1951, quando a cidade ainda era conhecida como Guaiquica. Casado com Solange e com os filhos Fabrício e Bruno, Fávero é neto de Pedro Forner, o grande responsável pelo loteamento que deu origem à cidade, o que faz dele um profundo conhecedor e apaixonado pela história coelhense.

Pedro Forner, avô materno de Edson Fávero, veio da Itália e se instalou em Iracemápolis (SP). Mais adiante, comprou uma grande fazenda, na qual já havia um projeto de loteamento, que aconteceu no ano de 1951. Nessa época, os residentes do local eram da família Forner, a qual Fávero cresceu. O lugar era apenas um pequeno povoado, com menos de 10 casas. Em determinado momento, Pedro Forner vendeu alguns lotes para Luís Fávero, avô paterno de Edison Fávero. “Foi que as duas famílias se uniram, aconteceu a união dos meus pais”, explica Fávero.

Italianos gostam de ficar junto, e foi nesse contexto que Fávero cresceu, várias pessoas numa mesma casa. “Era um monte de gente morando junto, isso é tradição na Itália, a gente costuma dizer que nosso altar é a mesa, aonde a família toda come junto”, explica Fávero. Cresceu, brincou na pequena vila, sujou os pés na terra vermelha de Guaiquica. “O povoado levava esse nome por causa da estação de Guaiquica, que ficava aqui”, afirma Fávero. Com o tempo, trabalhadores foram chegando para trabalhar na fazenda de Pedro Forner. “Veio bastante gente de Minas Gerais, após um período longo de seca que teve no estado, eles chegavam aqui e encontravam trabalho”, ressalta Fávero.

Fávero é o segundo filho entre cinco irmãos. “Somos em quatro homens e uma mulher, que é a mais velha, sou o mais velho dos homens”, explica. Ainda jovem, Edison Fávero viu surgir o segundo loteamento em Guaiquica. “Foi no início dos anos 70, após a morte de Pedro Forner, o loteamento permitiu que mais famílias chegassem”, conta. A cidade crescia em torno da agricultura. Fávero viu diversas plantações predominar no pequeno povoado, como cana de açúcar, algodão e laranja.

À medida que crescia, via o povoado se desenvolver. Assim durante a conversa, Fávero parece reviver cada momento, cada lembrança que sua memória é capaz de proporcionar. Como um legítimo descendente de italiano, o coelhense gesticula para contar que estudou na escola rural, que tinha apenas duas salas de aula. “Era uma unidade administrada pelo governo do estado, em seguida, passei a estudar na Antônio Alves Cavalheiro, construída pelo governador Carvalho Pinto”, relembra com alegria.

Fávero ainda estudou no Ginásio Estadual de Artur Nogueira (GEAN) antes de decidir o caminho pelo qual queria seguir. “Naquela época, tínhamos três possibilidades de ensino: normal, clássico e científico. Como eu queria a área de exatas, a opção certa era o ensino científico”, explica. O Ensino Médio foi feito em Limeira (SP). Como na época gostava de estudar, as lembranças do período escolar são as melhores possíveis segundo ele. “O ensino era de muita qualidade, os professores eram respeitados, as bibliotecas eram muito boas, enfim, um ensino muito forte”, relembra Fávero.

Uma bifurcação surgiu no caminho de Fávero. Um caminho levava ao curso de Engenharia, o outro, para o curso de Arquitetura. A decisão veio após um funcionário do pai de Fávero opinar. “Ele chegou em mim e disse que eu tinha muito talento para desenhar”, era o empurrão que faltava. Após obter outras informações sobre o curso, ele estava decidido, iria se tornar um arquiteto. Aí era a hora de escolher a faculdade. “Eu tinha duas opções, o Mackenzie, que era particular, ou a USP. Fiz cursinho e passei na estadual”, recorda.

Lá se foi o jovem estudioso. Mudou-se para São Paulo (SP) em busca de mais conhecimento. Sempre com muita dedicação, não demorou para que se destacasse no curso. Mais do que boas notas, ele era sério e comprometido. Comprometimento esse que despertou admiração de um professor. “Ele era dono de um escritório de arquitetura em Limeira (SP), e me convidou para trabalhar lá quando eu ainda estava no terceiro ano de faculdade”, explica. Com o convite aceito, Fávero começou a trabalhar na área de estudo antes de se formar. “Adquiri muita experiência nesse escritório”, constata.

Estação de Guaiquica foi inaugurada em setembro de 1912

Depois de concluir o curso, Fávero abriu seu próprio escritório em solo limeirense. Conseguiu diversos trabalhos com o empreendimento e pouco tempo depois foi indicado para se tornar professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “O convite aconteceu no ano de 1978, virei professor e pude alinhar ainda mais a teoria da prática”, comemora a lembrança. A troca da teoria para a prática aumentou ainda mais quando Fávero abriu um segundo escritório, dessa vez em Artur Nogueira. Em 1985, após uma exigência do reitor da Unicamp, ele começou a fazer o mestrado.

Com sucesso em ambas as áreas de atuação, surge um momento crucial na história do país, que mudaria também os caminhos da já conhecida Engenheiro Coelho. “Eu estava tocando meu mestrado quando se começou a discutir a reformulação da constituição do Brasil”. Foi nesse momento que um sonho antigo da família Forner reviveu na mente de Fávero. “Quero transformar Engenheiro Coelho em uma cidade, foi ali que essa vontade cresceu ainda mais em mim”, exclama.

A medida que conta a história, Fávero parece reviver tudo. Cada palavra é carregada de sentimento e memória. “E mais, para pleitear ser um município, primeiro tínhamos que ser distrito, e nem isso éramos”, relembra. Porém, nada disso desanimou o arquiteto. Os enormes distritos do Brasil, ao falharem em se tornar municípios, poderiam colocar uma imensa pedra no sonho da família. Mas não foi o que ocorreu, as dificuldades pareciam motivar ainda mais Edison Fávero. “Era necessário subirmos um degrau por vez, fiz então uma tese de mestrado mostrando que Engenheiro Coelho tinha condições de se tornar um distrito”, explica.

Um trabalho completo. Números, dados, leis, explicações e apontamentos recheavam os escritos de Fávero. “Com o trabalho finalizado, fui falar com um deputado da época, Benedito de Campos, para mostrar que Engenheiro Coelho reunia todas as condições de se tornar um distrito, entreguei o trabalho na mão dele”, conta. O deputado então levou o trabalho adiante e, um ano depois, Engenheiro Coelho se tornaria um distrito, após votação na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, fato que aconteceu no dia 14 de maio de 1980.

Com o primeiro objetivo alcançado, chegaria então a fase mais difícil, elevar Engenheiro Coelho à categoria de Município. “Logo que nos transformamos em distrito, Engenheiro Coelho passou a ter uma subprefeitura, e meu tio se tornou subprefeito e eu continuei buscando a emancipação”, relembra Fávero. No dia 1 de fevereiro de 1987, foi instalada a Assembleia Nacional Constituinte, que iria tratar da constituição nacional. “Fui candidato a vereador constituinte e venci, comecei a olhar as leis para entender o que era necessário para tornar Engenheiro Coelho Município”, detalha.

Um balde de água fria. As dificuldades eram muito maiores do que se imaginava. Naquele momento, o sonho ficou distante. “Exigia-se uma arrecadação absurda para se emancipar, tanto é que haviam mais de mil cidades pelo Brasil querendo a mesma coisa. Tínhamos aberrações como o distrito de Queimador (RJ) que, com 400 mil habitantes ainda era distrito”, destaca Fávero. Foi então que se começou uma luta junto aos deputados para que as leis de emancipação fossem alteradas. “Nós queríamos mostrar que se continuasse como estava, nenhum distrito se tornaria município no Brasil”, esclarece. Tanta dedicação, alinhada à luta de outras pessoas pelo país, fez com que o congresso discutisse as mudanças. “A ideia teve uma boa aceitação, e começaram a reformular as leis”, aponta.

Após diversas conversas e reuniões, ficou definido que haveria uma lei federal mais branda sobre emancipação, e que cada estado, desde que cumprissem os requisitos mínimos, fariam suas leis emancipatórias. “As leis do estado de São Paulo começaram a abordar alguns quesitos técnicos, como população, distância entre o município sede, entre outros”, recorda. Todo processo de discussão, levantamentos de documentos e votações durou cerca de um ano. Foi também montado um plebiscito, para que as pessoas de Engenheiro Coelho pudessem opinar sobre o tema. “A maioria concordava com a emancipação, essa foi a última fase”, completa Fávero.

O sonho almejado por muitos se tornou realidade, graças a determinação de Edison Fávero. Em 1991, a cidade deixava de ser um distrito e passava a ser o  município de Engenheiro Coelho. “Sonho realizado com muita alegria, algo que meu avô sonhava, nós conseguimos realizar”, conta.

Momento da assinatura da ata determinou a emancipação. Edison Fávero é o primeiro à direita

Edison Fávero é sem dúvidas um personagem importante para Engenheiro Coelho. Cresceu em um pequeno povoado e se tornou um professor, arquiteto e, também, um historiador. Prova disso, é que escreveu um livro sobre a história do município coelhense, publicado em 2011. “Eu já tinha escrito um, era um livro técnico sobre criações de cidades, e fui incentivado pelo ex-prefeito, José Otavio Schol, a escrever esse livro, que além de texto tem bastante fotografias”, explica Fávero.

O livro leva o nome de “Retratos de Engenheiro Coelho” e traz diversas imagens e textos explicando cada foto. “Eu já tinha muita coisa escrito em trabalhos acadêmicos, o que fiz foi transcrever aquele material numa linguagem mais acessível. Essa obra é o meu terceiro filho”, afirma Fávero, com o sorriso estampado no rosto.

Assim, o arquiteto vive na cidade que ele mesmo ajudou a criar, e se tornou peça fundamental na consolidação da história de Engenheiro Coelho. Atualmente, Edison Fávero é aposentado, contudo não deixou de desempenhar atividades, dessa forma coordena um grupo de pesquisas da Unicamp.

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